terça-feira, dezembro 29, 2020

THIN LIZZY: Phil Lynott era tímido, atrapalhado e tinha medo de ser rejeitado.

Tradução de Willba Dissidente para entrevista com a cineasta irlandesa Emer Reynolds conduzida por pelo jornalista Patrick Feyne sobre o documentário "Phil Lynott: Songs for While I'm Away". O texto original foi publicado no portal Irish Times em 26 de dezembro de 2020, data de estreia do filme nos cinemas da Irlanda.

Título Original:
Phil Lynott: ‘I didn’t know how shy he was, how awkward, and scared of rejection.

Link orginal:
https://www.irishtimes.com/culture/music/phil-lynott-i-didn-t-know-how-shy-he-was-how-awkward-and-scared-of-rejection-1.4429997?mode=amp


THIN LIZZY em Dublin no começo de 1974. Foto de Michael Putland.

Com depoimentos da família e amigos próximos, o novo filme da diretora Emer Reynolds "Songs For While I'm Away" (Músicas para quando eu estiver ausente), apresenta uma narrativa diferenciada sobre o frontman do THIN LIZZY. 


Muitos de nós estivemos falando o nome de Phil Lynott errado. Até mesmo Emer Reynolds, diretora do divertido filme "Songs for While I'm Away" que celebra o frontman do Thin Lizzy, peleja com a pronunciação correta.

"Não tem como eu rebobinar meu cérebro", ela afirma. "Eu e todo mundo em Dublin temos chamamos ele de Phil Linnet desde sempre. Lynott (lie-not) é a pronuncia correta do nome (lai-noty em português). Phil sempre corrigia as pessoas. Ele costuma dizer "Why not lie-not" e sua avó dizia sempre (sobre seu sobrenome) "nós não somos uma família de passarinhos. Mas o dublinenses tem o seu jeito próprio de fazer as coisas. E ele preferia Philip. Ele não ligava para Philo, mas eu acredito que ele não gostava de Phil. Só que a banda sempre o chamava de Phil, então o nome ficou". Ela dá risada. "Ele era um homem problemático até mesmo com o próprio nome".





Thin Lizzy em um camarim em Londres durante 1974. Foto de Michael Putland.

Reynolds, cujos trabalhos anteriores incluem "Farthest" (sobre o programa espacial Voyager) e "Here Was Cuba" (sobre a crise dos misseis em Cuba durante a Guerra Fria), ama Lynott e THIN LIZZY há muito tempo. "Minha irmã e eu tivemos dois namorados da escola secundária St. Joseph's em Fairview e eles eram fanáticos pelo Lizzy", ela revela. Eles nos apresentaram o Lizzy quando eu tinha 15 ou 16 anos. Eu era meio "pegajosa" em termos de música. Eu curtia CHRIS DE BURGH e STEELY DAN e NEIL YOUNG. Eu estava atirando para todos os lados. Mas então eu tive a apresentação adequada de todos os discos e ficava desconstruindo todas as letras e cai numa obsessão no meio da adolescência pelo THIN LIZZY. Eu tinha um estêncil deles na minha mochila de escola. De verdade, eu fui no último show deles em Dublin em 1983".

No filme da diretora, os membros da banda e amigos atestam que o último show em Dublin foi uma performance peculiarmente mediana. "Mas eu achei incrível", diz Reynolds. "Foi muito emocional e eu não conseguia acreditar que era o fim. Parecia que eles ficariam lá para sempre. Achei que talvez eles romperiam e iriam fazer outras coisas e então voltariam a tocar juntos. Me sinto muito privilegiada de ter tido a oportunidade de vê-lo. Eu estava comendo na palma da mão dele, Lynott, e ainda que fosse uma performance inferior do THIN LIZZY, a audiência estava berrando e havia muita alegria. Ainda assim eu sabia que eles estavam chegando ao fim e ele estava lutando muito contra o vício".

Lynott faleceu em 1986, tragicamente jovem, com 36 anos, e isso tem ofuscado sua estória desde então. "Obviamente, quando ele faleceu, isso foi imediatamente conectado com o fato dele usar drogas", argumenta Reynolds. "Foi muito triste que fosse essa a estória contada, ao invés de se narrarem de sua ascensão incrível, de seu talento. Eu gosto de pensar que que nos anos entre aquela época e agora, nós nos tornamos mais maduros enquanto sociedade e temos muita mais compreensão em relação as pessoas com esses tipos de problemas em suas vidas. Nós não julgamos mais tão rápido".

THIN LIZZY ao vivo em Wembley. Foto: Fin Costello / Redferns.

Parte do que Reynolds está tentando fazer em seu filme é sutilmente subverter a narrativa de "ascensão-e-queda" com a presença de amigos íntimos e parentes, incluindo, pela primeira vez, as filhas de Philip. "Eu não estava interessada nesse tipo terrível, sensacionalista e lascivo de narrativa de tabloide de um rockstar que destrói quartos de hotel e então cai terrivelmente em desgraça. Eu estava interessada em algo com mais nuances, que focasse no poeta, no musicista, no homem por trás daquela imagem".

Então, seu filme foca nos relacionamentos de Lynott, na sua arte e o quão forte ele trabalhou nela. A propósito, o disco favorito de Reynolds é "Nightlife" do THIN LIZZY.  Por que então ela quis evitar a versão mais lasciva da estória? "Eu acho que sei", ela começa, "todos conhecemos essa estória e a vida de Phil Lynott cabe direitinho nela... esse pobre, filho ilegítimo criado pela sua vó, sua grande escalada ao sucesso, cem mil pessoas no Sydney Opera House, então chegam as drogas e ele perde tudo e morre ... é a estória que conhecemos, que foi contada 100 vezes.

"É um clichê, uma estória de machão, e eu acho que há um interesse salaz na queda. Eu não acho isso interessante. O que me interessa é sobre ele em sua vida, não sua morte ... O que o fazia funcionar? O que o fez escrever as músicas que ele escreveu? Como um pequeno menino mestiço em Dublin na Irlanda dos anos 1950 e 1960 sonhou sua vida e forjou seu caminho? Eu acho isso incrível".

Philip tentava revelar seu eu real por meio de suas músicas, mas por vezes isso era encoberto por essa grande e barulhenta banda de Rock. Ele estava se desviando o tempo todo.

Ela tinha alguma ideia pré-concebida sobre Lynott? 

"Como uma fã idiota, eu comprava muito do que eu estava vendo", ela admite. "Eu achava que ele era super confiante e sabia exatamente o que ele estava fazendo. Isso é certamente o que ele exalava no palco. Então, eu desconhecia o quanto tímido ele era. Eu não sabia o quão atrapalhado ele era, quão vulnerável e não sabia do seu medo de rejeição. Eu não percebia que ele havia criado essa imagem rocker, essa persona Rock 'n' Roll, essa super-imagem como uma forma de disfarçar a si mesmo, como uma forma pela qual você poderia interagir com o mundo". 

"E, também não sabia da jornada que ele passou desde ser aquele menino tímido, poético, que estava interessado na cultura e na mitologia da Irlanda e teve esses sonhos de criar canções, até esse outro personagem; mais velho, sexy e uber masculino (extremamente masculino)".

Então, de onde veio isso tudo? "Eu acho parte da estória de como era veio do qual raro ele era e também o quão amado ele foi", ela opina. "Ele fala do amor que ele teve na família Lynott quando ele chegou na Irlanda. Ele não foi separado e enxotado. Ele foi absorvido nessa grande família de Crumlin que o adorava. Ele teve de se separar de sua mãe e veio morar em Dublin com sete anos. Há muitas trevas e tristeza nisso. Certamente, se separar de sua mãe deve ter rasgado um buraco enorme em seu eu interior e em suas crenças. Mas ele veio para cá e foi amado. Isso é muito claro em todas suas estórias. Não era a Irlanda multicultural que nós conhecemos hoje. Ainda assim ele conseguiu se destacar. 

"Lynott se destacou, de qualquer maneira. Ele era interessado em roupas. Ele era interessado em estilo. Ele ficava bem feliz sendo um estravagante, empavonando-se e sendo único. Então, ele ganhou muito da sua  confiança em sua infância, eu acho. Escondida entre a perda, a separação e a vulnerabilidade havia uma grande autoconfiança". 



Phil Lynott em 1979. Foto: Koh Hassabe.

Em sua adolescência, a diretora não questionava a imagem pública do ídolo. Ela continua. "Ele era tão bonito e expressivo. Literalmente, corporificava para mim o sex appeal... Eu nunca realmente vi que poderiam haver outras partes dele. Adam Clayton (baixista do U2) fala de como estrela do Pop ou do Rock precisa de uma armadura para subir no palco... Philip tentava revelar seu eu real por meio de suas músicas, mas por vezes isso era encoberto por essa grande e barulhenta banda de Rock. Ele estava se desviando o tempo todo. Mas, eu amo que ele estive se escondendo de todos.

"Ele contava como seria muito mais fácil para ele dizer 'vou te demolir' do que era 'eu te amo' e revelar a pessoa sensível e vulnerável. Ele criou um meio pelo qual poderia se relacionar com o mundo. Eu acho que Midge Ure (coorganizador do Band Aid) fala no filme que esse era o Philip que Lynott tinha em conta, que esse era o Philip que Lynott queria ser".

Sem hesitar, ele também abraçou sua origem irlandesa, o que a diretora pensa que era enormemente importante para sua reputação na Irlanda.

"Quando ele veio para a Irlanda, ele tinha um forte sotaque de Birmingham, mas com muita velocidade, na escola, ele perdeu esse sotaque e adotou essa identidade, muito coerente, de dublinense... Ele não tentou apagar seu sotaque. Ele estava muito determinado em estar conectado com aqui, sempre fez turnês por aqui e deixou a Irlanda bem perto, e sempre descreveu a banda como sendo um conjunto irlandês, ainda que, na maioria das vezes, os irlandeses fossem minoria ou só 50 % do grupo".




Capa do documentário. Fonte: divulgação.

O que faz esse documentário diferente dos seus trabalhos anteriores? "De verdade, eu senti como uma dublinense e como uma fã que eu precisava fazer Phil Lynott orgulhoso", ela admite. "Adam Clayton chegou a me dizer 'você está com uma responsabilidade e tanto nas mãos, sabia' e eu sabia. O sendo de responsabilidade, essa era a diferença. Eu estava escolhendo que partes da sua personalidade e vida focar. E eu estava bem ciente de meu papel nisso tudo. Eu estava escolhendo a cereja do bolo (mas) sempre tentando ser honesta e aberta e abraçar a verdade o tanto quanto fosse possível".


É, mais ou menos, como apresentar um ícone sagrado. Às gargalhadas, ela admite, "é assustador".

Se Lynott não tivesse falecido, o que ela pensa que teria acontecido?

"Eu gosto de imaginar, se ele tivesse vivido, o THIN LIZZY teria tido outra chance e ele estaria em turnê como todos esses rockers que estão por ai com 60 e 70 anos lotando estádios. Eu amo pensar que essa seria a jornada que ele estaria trilhando. 

A diretora Emer Reynolds. Foto: divulgação.

"Ele era um tipo muito interessante e aberto às experimentações... eu acho que se ele tivesse se regenerado e ficado vivo - em algum outro universo, isso não teria sido o máximo? - Eu acho que ele estaria fazendo um trabalho muito interessante e cheio de nuances. Realmente acho que ele teria surpreendido a todos nós".



https://www.youtube.com/watch?v=O6bz2WXoCa4

"Songs for While I'm Away", título homonimo ao primeiro livro de poemas de PHIL LYNOTT estreou nos cinemas irlandeses dia 26 de dezembro de 2020 e não há qualquer previsão de qualquer forma de lançamento no Brasil.

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