domingo, junho 02, 2019

Opinião: foi a política que dividiu a cena Metal?


Desde o golpe que resultou no impeachment de agosto de  2016 que a política está latente como nunca na sociedade brasileira. Como o Coup D'Etat vinha carregado de ódio misógino, neopentecostal, integralista e homofóbico, tensões emergiram em toda sociedade brasileira entre os que defendem o golpe (cuja agenda continua no governo Jair Bolsonaro) e aqueles que se opõem ao autoritarismo. Ainda que a tomada de liberdade civis e individuais sejam antônimos do significado de Rock'n'Roll, setores reacionários da sociedade vêm acusando a política de ter fragmento amizades e relações, inclusive desunindo a cena Metal. Já que os Headbangers não conseguem concordar se a primeira banda do estilo foi o BLACK SABBATH ou o JUDAS PRIEST, esse texto vem mostrar que a nossa cena Metal sempre foi radical e nunca unida; sendo que as posturas totalitárias e conservadoras estão a desunindo ainda mais.


Caricatura de 1987 usado num anuncio de "procura-se baterista" do CELTIC FROST ilustrando a então treta do Thrash Metal com o Hard Rock.


Metal sem a diversidade e a subversão não seria mais que música com guitarra, todavia a tal desunião no movimento underground - ao contrário de quem só curte pela internet ou em shows internacionais de grande porte vêm dizendo - existe desde o começo da cena. São os Thrashers chamando os Hard Rockers de posers, os Góticos reclamando dos Headbangers frequentando os rolês deles, a galera do som extremo criticando aqueles mais ligados aos anos 1970, os trues apontando que tal e qual se venderam ao sistema, produtores de eventos sabotando os eventos de outros produtores; em inúmeras rixas e rivalidades de convivência entre os grupos urbanos. Isso sem contar brigas históricas como a dos Punks com Skinheads neonazistas, que por vezes acontece em espaços partilhados com outros grupos, como os Headbangers.


Recado do OVERDOSE na sua estreia em disco, 1985.

Isso sem contar uma prática muito comum até os anos 1990 que eram as intimações. Você estava em um rolê e vinha alguém de maneira nada amistosa querendo saber o quanto você entendia das bandas que usava nas camisetas e patchs. O fenômeno é tão antigo quanto a cena Metal e abrange todo o Brasil. Num dos primeiros discos de Metal lançados em nosso país, o split "Século XX / Bestial Invasion", o OVERDOSE denuncia isso no encarte. O pioneirissímo DORSAL ATLANTICA trata do tema na faixa "Metal Desunido", de 1988 etc. Estamos falando de Brasil, óbvio, mas no exterior a desunião também ocorre e é expressa, por exemplo na fala do RATT sobre o METALLICA no documentário Heavy: The Story of Metal, do VH1 e outros casos como as brigas dos Mods e dos Rockers na Inglaterra dos anos 1960, quando o próprio Rock'n'Roll ainda era novidade!

O Rock Dissidente é pela diversidade e não concorda com a fragmentação e desunião na nossa cena da mesma maneira que sabe que tal a acompanha muito antes que "isentões de direita", "headcrentes" e "bangers consevadores" resolvessem sair do armário. A mesma lógica conservadora, unificante que massacra diferenças, que sustenta as rivalidades entre "tribos" e intimações, é a dos que acham que o Metal comporta posturas machistas, lgbtfóbicas, misóginas e conservadoras de inspiração cristã. O Metal há muito é desunido não por diferenças de opiniões, como dizem os conservadores, mas  além de todas rixas que já existiam, vimos nos últimos anos se manifestar no Metal pessoas conservadoras que não aceitam o outro, o diferente, convivendo dentro da mesma cena underground que eles.





Se queremos mesmo ter um underground unido, e não unido em panelinhas contra panelinhas, devemos começar dando voz e respeitando os diferentes. Isso não significa que todo Metal tenha, por exemplo, de ser LGBT, mas sim reconhecer que as mesmas pessoas que tem preconceito com os LGBT's também odeiam o Heavy Metal. Então, qual o motivo para pensar igual, para professar o mesmo preconceito de quem abomina o Metal? Afinal, somos Headbangers e não um tiozão chato que passa a vida assistindo Ratinho na televisão!

Ainda que muitas bandas louvem ao herói e a caras fortes e másculos, isso NÃO significa que você, que é Headbanger, deva sair por ai declarando ódio aos transsexuais, mendigos e outras minorais, como fazem os playboys da sua cidade em seus carrões. Afinal, se você é Headbanger, por que se comportar como playboy?

Lembramos, ainda que pareça desnecessário, que discurso de ódio contra minorias são crimes e não a expressão de uma opinião política. Além de radical, o Metal é liberdade e liberdade significa viver sem opressões e sem oprimir ao outro. Vivamos radicalmente então as diferenças em nossa cena!

Rock Dissidente (maio - junho de 2019).
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2 comentários:

  1. Excelente texto cara! Me apaixonei pelo rock pelo seu carater libertario e contestador.

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  2. Saudações! Obrigado do seu comentário e de nos acompanhar!
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